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sábado, 24 de setembro de 2011

O ódio dos covardes


Millôr Fernandes, gênio brasileiro, certa vez definiu Chico Buarque de Holanda como “unanimidade nacional”. Não era bem assim: os militares que ocupavam o poder o detestavam (embora, numa letra memorável, o próprio Chico lembrasse que a família dos ditadores estava no seu fã-clube: “Você não gosta de mim/ mas sua filha gosta.”).
E não eram só os militares. Muitos anônimos, pelo anonimato sentindo-se protegidos, usam agora a internet para agredir o compositor. Chico até se assustou: pensava que gostavam dele, de repente se sentiu detestado. Crítica, tudo bem: este colunista, por exemplo, admirador que remonta aos tempos de “Pedro Pedreiro”, não se deu ao trabalho de decorar nenhuma das músicas do último disco de Chico, e já não gostava de “Morena de Angola”. Mas o que surge nos comentários anônimos na internet não é crítica à composição: é ódio ao compositor.
É um ódio curioso. Não é crime detestar Chico Buarque ou qualquer outra pessoa. Por que, então, buscar a proteção do anonimato? Para poder falar besteira sem se justificar, para baixar o nível ao máximo, para vomitar em vez de dizer. Pior: para poder expressar, também, opiniões racistas, homofóbicas, odientas, tentando menosprezar ou destruir tudo o que é diferente.
Um caso interessantíssimo está acontecendo nesse instante: 1.200 assinantes de um portal de internet cancelam suas assinaturas, como protesto pela omissão do portal diante de manifestações de ódio racial. A eleição da representante de Angola para Miss Universo provocou um terremoto de revolta racista, e o portal simplesmente se omitiu, como se não tivesse nada com isso.
Culpa do público? Em boa parte, sim: o ser humano tem, ao lado de qualidades notáveis, defeitos que são difíceis até de imaginar. Mas a maior parte da culpa é dos responsáveis por blogs e portais, mal-intencionados ou simplesmente preguiçosos, que não fazem a moderação dos comentários e abrem seu espaço para qualquer maluco disposto a gritar “fogo” num estádio lotado em nome daquilo que considera “liberdade de expressão”.
Este colunista recebe todos os dias dezenas de mensagens que se referem a personalidades públicas de maneira indecorosa. Outras criticam cidadãos conforme o país ou região em que nasceram, ou a religião que praticam, ou a própria falta de religião. Este tipo de mensagem tem seu próprio nicho: a cesta seção.

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